A importância do refletir sobre o pensar (numa sociedade em
que pensar o pensar é, frequentemente, confundido com pensar que pensamos)
surge, nos nossos dias, como inquestionável.
Num tempo em que a informação se transmite em intensos e
interruptos fluxos, através dos mais diversos canais, dotando os indivíduos dos
dados necessários e suficientes a um sustentável entendimento do mundo, poder-se-ia
julgar que a capacidade ideal de refletir sobre as mais diversas realidades
existenciais estava, agora, bem mais próxima.
Contudo, não é isso (necessariamente) que acontece.
A secular dinâmica de poder que assenta no controle das
ideias e emoções das massas populacionais continua, nos nossos dias, com tanta
eficácia como até aqui.
Aliás, o exercício do poder arrastou
sempre, como funções indispensáveis, mecanismos de controlo da vontade das
populações.
O alargamento das fontes e fluxos
informativos e a criação de uma opinião pública mais ou menos autónoma, foram
sempre acompanhados de um correspondente reforço das técnicas de condicionamento
de ideias e pensamentos; sublimando-se estratégias, refinando-se discursos e
atitudes populistas, desenvolvendo-se comportamentos demagógicos cada vez mais
subtis e criativos.
O ditador de antanho aprendeu com o
tempo a movimentar-se em complexos cenários de interesses públicos muitas vezes
contraditórios, a tirar partido de discrepâncias e desarmonias sociais e a
assumir uma imagem de marca: artificial, mas sociologicamente sustentada.
De uma maneira geral, a atual maior dimensão e diversidade
noticiosa, tem sido acompanhada de novas e mais sofisticadas estratégias de
controlo psicossocial, com origem nas
respetivas multinacionais de informação e suas perversas teias de interesses nacionais.
Estratégias em que, ao silêncio (quantas vezes atroador) dos
temas incómodos, se alia uma, mais ou menos subtil, instrumentalização dos temas
convenientes.
Instrumentalização que se faz de explícitas ou implícitas
manipulações (às vezes, quase, subliminares) que começam logo pela estrutura
noticiosa (por mais simples que a mesma possa parecer): quem fala, como fala, de
que parte, em que ordem sequencial, que imagens se utilizam, títulos e
paragonas; síntese final ou inicial, etc.,…
E, continua, com a intervenção direta ou não, formal ou
informal (em texto, voz ou imagem) do respetivo jornalista (locutor, pivot ou
repórter) cuja análise de conteúdo (mesmo que superficial) revela clara parcialidade,
expressa através de títulos tendenciosos, calculados enfâses, estratégicos compassos
de espera, repetições recorrentes, exclamações assertivas e, até, comentários a
propósito.
E como os jornalistas são hoje figuras mediáticas, também a
sua opinião exerce, naturalmente, forte influência.
Tudo isto, muitas vezes, procurando obter determinadas
reações emocionais (sejam de indignação, sejam de incondicional adesão)
sociologicamente criadas e direcionadas.
São mecanismos contra os quais estamos praticamente
indefesos.
Até porque, em grande parte, nem sequer nos apercebemos de
tal.
Adquirem, assim, particular importância, iniciativas como
aquela que levou recentemente à criação em Santarém da AIESMP: Associação
Internacional de Estudos Sobre a Mente e o Pensamento (vulgo Associação sobre o
Pensar) cujo objetivo é, precisamente, refletir sobre a forma de construção do
pensamento a partir das diversas experiências de vida: sociais, culturais,
políticas, históricas e afins.
Sobre a importância das práticas na criação das teorias que
nos enformam e que, muitas vezes, vemos como princípios intemporais: quase
sagrados.
Afinal, conhecer melhor como se forma o nosso pensamento do qual
emergem ideias e opiniões é dotarmo-nos de melhores condições que nos permitam
afirmar num mundo global: tendencialmente consubstanciador de perspetivas
unívocas. Ao serviço de interesses que nem sempre são os nossos.
Que nos permita, afinal, pensar melhor.
E, principalmente, pensar pela nossa cabeça.
E não por qualquer uma outra. Por mais brilhante que seja.