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sexta-feira, 8 de abril de 2016

O tecto e as paredes




Agitam-se as hostes folcloristas com a recente avaliação que a Federação do Folclore Português desenvolveu por todo o pais (através dos conselhos técnicos regionais) geradora, como era de esperar, de contestações várias: uma mais, outras menos sustentadas.
Geradora, aliás, como também era de esperar, de injustiças várias, que se fundam num processo que, pese embora as boas intenções de quem de direito, não possuía, afinal, qualquer possibilidade efetiva de ser justo e coerente.
De ser minimamente objetivo, e suportado, mesmo que vagamente, numa metodologia técnico-científica. Susceptível de, pelo menos, credibilizar e validar as classificações obtidas.
É que o processo enferma de uma tripla incongruência:
Em primeiro lugar, a grande maioria dos conselheiros técnicos regionais (pesquisadores locais que só conhecem, quando conhecem, a realidade da sua aldeia ou freguesia e não possuem uma formação socio-cultural que lhes permita extravasar daí de forma sustentada, contextualizar padrões culturais ou analisar funcionalidades sociais) não têm, nem poderiam ter, competência técnica e cientifica para tal*.
Em segundo, a maioria dos mesmos são dirigentes de agrupamentos que fazem afinal parte do seu universo de avaliação. O que acarreta dois problemas: Por um lado tendem a ver todos os projetos como cópias, necessariamente deformadas, do seu. Por outro, dão corpo a um evidente conflito de interesses: marcante e omnipresente, seja qual for a estratégia que se adote na respetiva avaliação.
Mas existe ainda um outro problema. Mais determinante ainda.
Susceptível de, só por si, inviabilizar todo o processo, mesmo que os anteriores não existissem!
É que, fugindo como gato escaldado da metodologia científica, não querendo entrar em choque com interesses instalados e amizades diversas que os ligam a diversos dirigentes de agrupamentos folclóricos e sendo pessoas (apesar de dedicadas) algo prosaicas e socioculturalmente pouco esclarecidas, os dirigentes folclóricos nacionais nem sequer percebem esta coisa básica:
Não se pode proceder a uma avaliação qualitativa, se não existir, sequer, um conceito minimamente comum do que é “qualidade”!
Tão simples como isto!
Um conceito que obste, por exemplo, que certos agrupamentos folclóricos que em certas zonas do país são elevados aos píncaros da sublime valorização sejam, noutras, vistos como pitorescos estereótipos, que nem mereceriam ser federados.
Como é que numa situação destas alguém ousa proceder a uma avaliação nacional de representatividade.
Na verdade, não se pode avaliar representatividades, se não soubermos, sequer, o que é Folclore!
Pois, sem isso, não podemos naturalmente saber o que é representatividade folclórica!
Ora, o que acontece, é que, cada um de nós (dirigentes, conselheiros, folcloristas, diretores e ensaiadores) possui um conceito diferente; muitas vezes radicalmente diferente; algumas vezes antagónico! Quase sempre empírico, vago, subjetivo.
Ou, simplesmente, não possui conceito nenhum!
Como é que se pode, assim, exigir uma qualidade de representação se não se sabe, sequer (mesmo que de forma aproximada) o que isso quer dizer.
Portanto, era por aí que se devia ter começado fazer a casa.
E não esperar que o teto, por uma qualquer singularidade mística, se mantenha, eterna e milagrosamente, suspenso.


*E se isso se passa com os conselhos regionais, que dizer do Conselho Técnico Nacional (responsável, último, por estas avaliações)  cujo critério de pertença é, simplesmente, a pertença aos órgãos executivos da Federação?
Se aqueles dificilmente conseguem contextualizar realidades regionais no tempo e no espaço, calcule-se estes (cujos elementos na sua maior parte são igualmente folcloristas locais de base e que nunca evoluíram daí) e cujo âmbito territorial é, afinal, todo o território nacional?
Pois é…


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