Agitam-se as hostes
folcloristas com a recente avaliação que a Federação do Folclore Português
desenvolveu por todo o pais (através dos conselhos técnicos regionais)
geradora, como era de esperar, de contestações várias: uma mais, outras menos
sustentadas.
Geradora, aliás, como
também era de esperar, de injustiças várias, que se fundam num processo que,
pese embora as boas intenções de quem de direito, não possuía, afinal, qualquer
possibilidade efetiva de ser justo e coerente.
De ser minimamente
objetivo, e suportado, mesmo que vagamente, numa metodologia
técnico-científica. Susceptível de, pelo menos, credibilizar e validar as
classificações obtidas.
É que o processo
enferma de uma tripla incongruência:
Em primeiro lugar, a
grande maioria dos conselheiros técnicos regionais (pesquisadores locais que só
conhecem, quando conhecem, a realidade da sua aldeia ou freguesia e não possuem
uma formação socio-cultural que lhes permita extravasar daí de forma
sustentada, contextualizar padrões culturais ou analisar funcionalidades sociais)
não têm, nem poderiam ter, competência técnica e cientifica para tal*.
Em segundo, a maioria
dos mesmos são dirigentes de agrupamentos que fazem afinal parte do seu
universo de avaliação. O que acarreta dois problemas: Por um lado tendem a ver
todos os projetos como cópias, necessariamente deformadas, do seu. Por outro, dão
corpo a um evidente conflito de interesses: marcante e omnipresente, seja qual
for a estratégia que se adote na respetiva avaliação.
Mas existe ainda um
outro problema. Mais determinante ainda.
Susceptível de, só por
si, inviabilizar todo o processo, mesmo que os anteriores não existissem!
É que, fugindo como
gato escaldado da metodologia científica, não querendo entrar em choque com
interesses instalados e amizades diversas que os ligam a diversos dirigentes de
agrupamentos folclóricos e sendo pessoas (apesar de dedicadas) algo prosaicas e
socioculturalmente pouco esclarecidas, os dirigentes folclóricos nacionais nem
sequer percebem esta coisa básica:
Não se pode proceder a
uma avaliação qualitativa, se não existir, sequer, um conceito minimamente
comum do que é “qualidade”!
Tão simples como isto!
Um conceito que obste,
por exemplo, que certos agrupamentos folclóricos que em certas zonas do país são
elevados aos píncaros da sublime valorização sejam, noutras, vistos como
pitorescos estereótipos, que nem mereceriam ser federados.
Como é que numa situação
destas alguém ousa proceder a uma avaliação nacional de representatividade.
Na verdade, não se
pode avaliar representatividades, se não soubermos, sequer, o que é Folclore!
Pois, sem isso, não
podemos naturalmente saber o que é representatividade folclórica!
Ora, o que acontece, é
que, cada um de nós (dirigentes, conselheiros, folcloristas, diretores e
ensaiadores) possui um conceito diferente; muitas vezes radicalmente diferente;
algumas vezes antagónico! Quase sempre empírico, vago, subjetivo.
Ou, simplesmente, não
possui conceito nenhum!
Como é que se pode,
assim, exigir uma qualidade de representação se não se sabe, sequer (mesmo que
de forma aproximada) o que isso quer dizer.
Portanto, era por aí
que se devia ter começado fazer a casa.
E não esperar que o
teto, por uma qualquer singularidade mística, se mantenha, eterna e
milagrosamente, suspenso.
*E se isso se passa
com os conselhos regionais, que dizer do Conselho Técnico Nacional
(responsável, último, por estas avaliações) cujo critério de pertença é, simplesmente, a
pertença aos órgãos executivos da Federação?
Se aqueles dificilmente
conseguem contextualizar realidades regionais no tempo e no espaço, calcule-se
estes (cujos elementos na sua maior parte são igualmente folcloristas locais de
base e que nunca evoluíram daí) e cujo âmbito territorial é, afinal, todo o
território nacional?
Pois é…
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