Confrontando-se com a escassez de elementos masculinos entre os seus componentes, alguns agrupamentos folcoricos têm optado por transvestir algumas raparigas, vestindo-as com trajes masculinos e criando assim um simulacro de representação que podemos definir como algo burlesco.
Ora bem, os novos condicionalismos sociais que fazem dos nossos jovens indivíduos dotados de outras perspectivas e sujeitos de outras motivações, vai retirando aos grupos folclóricos o papel tradicional de elemento social integrador e oportunidade basilar de convívio um pouco por todo o país e, pontualmente, pelo estrangeiro.
Assim o seu papel de aglutinador de anseios e expectativas vai-se naturalmente diluindo. E a sua capacidade mobilizadora, naturalmente decaindo.
È mais um efeito da mudança social em curso, sobre a qual os responsáveis desta área, nomeadamente a Federação, se deveriam debruçar! Se, naturalmente percebessem, pelo menos, o que isso é!
Perceber, por exemplo, que os grupos folclóricos têm, cada vez mais, obrigação de fomentar e diversificar as suas capacidades de atracção de novos elementos. Diversificando iniciativas e formas de representação. Delegando competências directivas e não só! Contextualizando os padrões culturais apresentados. Atraindo jovens e não jovens sensibilizados para as questões culturais e patrimoniais e não apenas para a actividade recreativa da dança, de motivação mais intensa mas muito mais efémera.
Já não chega, hoje, simplesmente existir! É preciso algo mais!
É assim normal que alguns grupos se vão debatendo com lacunas nas suas fileiras. De raparigas e mais frequentemente de rapazes, ainda hoje (apesar de tudo), com mais autonomia social e alvo de maiores solicitações lúdicas.
Isto e o facto de muitos responsáveis por agrupamentos não fazerem, muitas vezes, ideia da matriz conceptual que está ligada à representação folclórica, leva-os a fazer disparates desses.
É um facto que, como o nome indica, a apresentação de um espectáculo de folclore é, enquanto actividade, essencialmente uma representação. Composta de um conjunto de personagens que resultam do desempenho de determinados papéis por um determinado conjunto de actores.
È também um facto que, em última instancia, o encarnar de qualquer personagem pode ser desempenhado por um qualquer actor: homem ou mulher!
È até verdade que nos primórdios do teatro só os homens eram actores, desempenhado aí, indiferentemente, papéis masculinos e femininos.
Tudo isto é verdade!
Mas...
Mas, não estamos no século XVIII, em que a uma mulher minimamente respeitável era interdito participar em qualquer espectáculo. Principalmente público!
Nem a representação folclórica é, enquanto essência, semelhante à representação de uma peça teatral de autor, cuja reinterpretação ou manipulação apenas tem limites nos limites da criatividade artística do encenador ou dramaturgo.
Uma representação folclórica pretende ser uma aproximação o mais rigorosa possível, às vivências seculares; preferencialmente representadas tanto na forma como no conteúdo.
Quer isto dizer que colocar homens a fazer o papel de mulheres ou, como é o caso, mulheres a fazer o papel de homens surge como uma incongruência no contexto socio-cultural da representação.
Numa representação que tenta recriar em palco (e não só) de uma forma coerente, o modelo vivencial ancestral em que se movimentavam os membros das comunidades aí representados, tal subterfúgio soa, naturalmente, a falso!
È afinal tal situação é absolutamente desnecessária!
Por isso é um erro maior ainda!
É que os grupos folclóricos não têm que ter (como muitas vezes se pensa) nem um determinado número de pares (“requeridos” apenas por razões de eficácia coreográfica, a maior parte das vezes falaciosas) nem, naturalmente, o mesmo número de rapazes e raparigas.
Se se der o caso dos rapazes serem em maior número, tudo se resolve gerindo em alternância a participação dos mesmos No caso referido (excesso de raparigas), a solução é ainda mais simples: simplesmente porque, as ditas, dançavam tradicionalmente, muitas vezes, umas com as outras!
Por razões diversas, em alturas diversas, de forma temporariamente mais breve ou demorada mas, principalmente, de forma natural, espontânea e... frequente.
Deste modo, se encarada enquanto mecanismo de representatividade, tal situação (ao invés de um défice) pode e deve ser encarada, até, como uma mais valia!
Para isso, contudo, muitos dos responsáveis dos grupos folclóricos para quem estas coisas são a “quadratura do círculo”, terão de parar um bocadinho para pensar!
Eu sei que essa coisa de pensar, muitas vezes, faz dores de cabeça! Mas,... façam lá um esforçozinho!
Comecem por fazer esta pergunta: o que é que eu estou a aqui a fazer? O que é que eu quero representar?
Vão ver que vão chegar à conclusão, que pretendem (nem mais nem menos), que representar os bailes e iniciativas afins que, duma forma ou doutra, em tempos idos, animavam as nossas comunidades especialmente do interior; as nossas aldeias rurais se quisermos.
Depois, só têm que saber como eram os tais bailes! Qual a lógica e a funcionalidade dos mesmos!
Em suma,.. têm que saber como era, para puderem, agora, contar como foi!
Será que é assim tão difícil?!!
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