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quarta-feira, 16 de março de 2016

Em nome de Deus



O terrorismo islâmico tem constituído o tema favorito de um linear tratamento mediático, em que, por arrastamento, os muçulmanos passam a ser olhados como inimigos públicos (ativos ou passivos), cuja existência justifica, só por si, uma política ocidental intervencionista e uma sociedade de mercado (como se tem visto) injusta e desigual.
O radicalismo islâmico é, aí, tratado como algo geneticamente maléfico. Algo que só a mais absoluta exterminação pode resolver.
Como se cada extremista fosse, não igualmente filho de Deus, mas, sim, filho do Diabo.
Afinal, curiosamente, a mesma argumentação (face ao Ocidente) dos referidos extremistas!
E, assim, os antagonismos em presença vão atingindo novas e maiores dimensões; que o ódio catalisa.
Tenho, contudo, algumas dúvidas acerca de muitos dirigentes ocidentais odiarem, sequer, os extremistas islâmicos.
Talvez tenham, sim, algum receio. Apesar das mais modernas e avançadas medidas de proteção. Mas ódio, suponho que não.
Afinal, os mesmos, cumprem um papel conveniente (mesmo que involuntário) na legitimação do intervencionismo político e militar ocidental, nas justificação das enormes despesas militares (agora que a guerra fria se encontra em “banho maria”) e, ainda, no reforço do controlo sobre os cidadãos, a pretexto da necessária segurança nacional.
Ódio, têm os extremistas islâmicos. E isso constitui uma das suas mais fortes motivações.
Ódio que vem, essencialmente, das controversas (chamemos-lhe assim) decisões que resultaram na criação do Estado de Israel e da correspondente expulsão dos palestinianos para campos de refugiados ou para a caótica e superlotada Faixa de Gaza. Situação que continua sem fim à vista; arrastando consigo, por exemplo, a inaceitável (para os muçulmanos) ocupação de Jerusalém.
Ódio que se incrementa cada vez que os interesses petrolíferos ou geoestratégicos americanos levam a intervenções explícitas como no Iraque ou na Líbia ou, implícitas, como no Egipto ou na Síria. Fazendo, recorrentemente, potenciar as sempre disponíveis tensões e conflitualidades étnicas, como oposição aos governos que lhe são hostis.
A criação do, assim chamado, “Estado Islâmico”, num território em que (por culpas ocidentais) o poder está pulverizado por diversos grupos étnicos, deve constituir para o extremista islâmico padrão, uma espécie de antecâmara do Paraíso.  
Um local em que se pode lutar contra o “Grande Satã” e seus “infiéis” acólitos, numa “guerra santa” capaz de garantir as ambicionadas “graças eternas”.
A afluência de jovens de variadas origens permite, provavelmente, um enquadramento de camaradagem entre potenciais mártires. Buscando aí, afinal, aquela que é, facilmente, vista como a maior de todas as causas: o desagravo a um Deus ofendido, como condição de recompensa de uma paradisíaca eternidade.
Deste modo, o previsível esmagamento deste embrião teocrático não irá servir de alerta a eventuais futuros recrutas.
Muito pelo contrário: a experiência, sublimada pelos respetivos serviços radicais de propaganda, tem tudo para se tornar um foco de atração para novos e velhos convertidos. Desejosos de se sacrificarem. De “morrer em nome do Senhor”.
Porque estas questões não se resolvem com mais repressão. Ou, pelo menos, apenas com mais repressão. Se resolvessem, há muito que estavam resolvidas.
Resolvem-se, sim, com o enfrentar das situações que sustentam as indignações extremistas. Que, não podemos esquecer, são “apenas” expressões radicais de uma insatisfação e indignação maiores.
Que se não são (obviamente) justificáveis, são, contudo, explicáveis.
Atenuar-se-iam, assim, as razões de conflitualidade existentes. Contribuindo, a médio-prazo, para enfraquecer as fileiras radicais: reduzindo-as uma dimensão mais ou menos controlável.
Afinal, isto é algo que até os dirigentes ocidentais percebem.
Mas, por diversas razões, lhes não interessa.
Porque isso seria reconhecer erros passados. Afetar interesses próprios, de amigos e aliados.
Reconhecer, em suma, uma nova ordem internacional: não baseada no direito da força, mas na força do direito. Que reconhecesse a todos os povos (apesar das suas diferenças) o direito à mesma dignidade.  


PS - As abomináveis execuções públicas de indivíduos ocidentais apanhados no frenesim de um fanático antagonismo, tem contribuído, naturalmente, para extremar as posições em presença.
Contudo, confesso que já algumas vezes me tinha perguntado quando é que os extremistas do EI começariam a imitar os EUA, quando estes se decidiram pelo mediático enforcamento público do antigo ditador iraquiano Saddam Hussein: presidente legítimo (pelo menos tão legítimo como os restantes que proliferam por este mundo; muitos deles aliados ocidentais,) deposto por uma, para todos os efeitos, ilegítima invasão militar externa.



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